Era uma vez um grande quintal onde reinava um poderoso galo. Orgulhoso da sua função, nada acontecia sem que ele soubesse. Com a sua força e coragem, enfrentava qualquer perigo. Era orgulhoso das suas armas poderosas, da beleza colorida das suas penas, do seu canto.
Todas as manhãs acordava pelo clarão do horizonte, e bastava que cantasse duas vezes para que o sol se elevasse ao céu. “O sol nasce pela força do meu canto” – dizia. “Eu pertenço à linhagem dos levantadores do sol. Antes de mim, era o meu pai; antes do meu pai, era o meu avô!” Um dia, uma jovem galinha, de beleza esplendorosa, veio morar no seu reino e o galo apaixonou-se. A paixão correspondida culminou numa noite calorosa de amor. Já de madrugada, veio o sono. Dormiu profundamente. As primeiras luzes do horizonte não o acordaram como de costume. Para lá do meio-dia, abriu os olhos e viu um dia azul, de céu brilhante e assustou-se. “Então não sou eu quem levanta o sol?” – Comentou desolado consigo. E caiu numa profunda depressão. O reconhecimento de que nada tinha mudado no galinheiro enquanto dormia trouxe-lhe um sentimento de inutilidade e questionar a sua própria competência. “O que vão pensar de mim?” – Murmurou para si mesmo. O medo gelou-lhe os ossos. Pensou em pedir ajuda aos céus e rezou baixinho, a chorar. Talvez tenha sido esse momento de humildade, único na sua vida, que o tenha ajudado a lembrar que, numa árvore, lá no fundo do galinheiro, ficava todo o dia empoleirado um velho galo filósofo que costumava dar orientações úteis e sábias a quem o procurasse. A convite, o galo angustiado empoleirou-se ao lado do filósofo e contou-lhe a história. O sábio ouviu cada detalhe com paciência. Depois, disse: – Antes, quando tu achavas que o sol se levantava pelo poder do teu canto, estavas enganado. Para definir o teu problema com precisão, tu tinhas o que pode ser chamado de “ilusão de onipotência”. Então, com a magia do amor, descobriste o teu próprio engano, e até aí estarias ótimo, porque nenhuma vantagem existe em estar tão iludido. Entretanto, agora, tu pensas que não tens nenhum valor, o que é, de certa forma, compreensível, já que baseaste a vida nisso. Contudo, estás apenas a trocar uma ilusão por outra. O que era chamado de “ilusão de onipotência”, agora pode ser chamado de “ilusão de incompetência”. Aos meus olhos, nada mudou. Tu eras e continuarás a ser um galo normal, cumpridor da tua função de gerir o galinheiro. Pensa bem: uma ilusão não pode ser substituída por outra. O caminho não está nas nuvens nem no fundo do poço, mas na realidade. O nosso herói desceu da árvore para a vida comum do galinheiro. No dia seguinte, aos primeiros raios da manhã, cantou para anunciar o sol nascente. E tudo continuou como era antes.
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